“A ATUAÇÃO DA OAB-SP ESTÁ PREJUDICANDO A CRIAÇÃO DE SISTEMAS MAIS EFICIENTES, MAIS QUALIFICADOS DE CONVÊNIOS FEITOS PELA DEFENSORIA PÚBLICA”, DIZ OSCAR VILHENA, DA CONECTAS

Conectas Direitos Humanos é uma ONG internacional, sem fins lucrativos, que atua há mais de sete anos no Brasil. A entidade tem como objetivo promover o respeito aos direitos humanos e contribuir para a consolidação do Estado de Direito na África, Ásia e América Latina. Em 2006, a ONG passou a ter status consultivo na Organização das Nações Unidas (ONU).
Conectas entrou na qualidade de amicus curiae na Adin 4163, proposta pelo Procurador Geral da República, sobre a inconstitucionalidade do convênio entre a Defensoria Pública de São Paulo e a OAB.

Amicus Curiae (“amigo da Corte” em latim) é um instrumento jurídico realizado por quem não é parte no processo e visa chamar a atenção da Corte para determinado aspecto que possa auxiliar o julgamento. O objetivo é defender interesses públicos e/ou privados de terceiros.

Oscar Vilhena é o diretor-executivo da Conectas. Mestre em Direito pela Universidade de Columbia (EUA), doutor em Ciência Política pela USP-SP e pós-doutorado em Direitos Humanos pelo Centre for Brazilian Studies (Universidade de Oxford/EUA), ele concedeu a seguinte entrevista à APADEP:

APADEP: Dr, qual o posicionamento da Conectas sobre a Adin 4163? Quais os motivos que levaram a entidade a entrar como amicus curiae?

Oscar Vilhena: Bem, é que tanto a Constituição Estadual quanto a lei que cria a Defensoria Pública em São Paulo, principalmente esta última, estabelecem que o convênio da Defensoria Pública será com a Ordem dos Advogados do Brasil. E a Constituição Federal não aventa essa possibilidade. O serviço tem que ser prestado pela Defensoria Pública e em casos onde não for possível atender, a defensoria deve construir aquela política que seja a mais adequada para o atendimento, sob viés do interesse público. Eventualmente pode ser um convênio com a OAB ou com outras organizações da sociedade civil que prestem esse serviço. O que a Constituição Federal não estabelece é que o monopólio dessa advocacia de interesse público subsidiário seja feito pela OAB. Então, essa será a posição da Conectas, que agora está sendo preparada para apresentarmos ao STF.

APADEP: O Doutor tem conhecimento de como funcionam estes convênios em outros Estados do Brasil?

Oscar: A Constituição Estadual e especialmente a legislação que instituiu a Defensoria em São Paulo criaram a impossibilidade de que o Estado, a Defensoria Pública, possa, dentro dos seus espectros de competência, que lhe são reservados pela Constituição, fazer escolhas públicas. Nós temos um regime Federativo em que a Defensoria é a responsável primária pela prestação da advocacia pública e o Estado deve ter a liberdade para suprir esse serviço que não for atendido pela instituição. Então, os outros estados da Federação são assim regulados porque é assim que a Constituição Federal determina. E no Estado de SP, em função certamente de uma pressão muito forte da OAB, transferiu-se essa responsabilidade, não abrindo espaço para que o Governo, a Assembléia Legislativa e a Defensoria, especificamente, possam construir outras políticas públicas para a assistência jurídica ao carente.

APADEP: A Defensoria foi criada em São Paulo só em 2006, 18 anos depois da Constituição assim obrigar os Estados. O que o Dr. recorda do processo histórico da criação da lei da Defensoria em SP, há dois anos?

Oscar: A minha percepção é de que houve um forte interesse corporativo por parte da OAB. Ela fez uma pressão muito forte junto à Assembléia Legislativa e essa pressão foi, de certa maneira, acatada. Com isso, incluiu-se esse dispositivo. É contra ele que o Procurador Geral da República está se insurgindo e nós entendemos que o faz com toda razão. A Constituição Federal impõe ao Estado a obrigação da prestação de atendimento jurídico ao carente e não confere nenhum tipo de monopólio de convênios. E esse monopólio, em alguma medida, foi instituído por intermédio dessa pressão da OAB na ALESP. Isso que me parece equivocado. Isso fere direta e substantivamente a Constituição, mas fere também o âmbito de autonomia dos Estados e, por conseqüência, fere o âmbito de autonomia da própria Defensoria. A Defensoria tem que ter a discricionariedade para escolher qual o melhor parceiro e em quais condições, circunstâncias, o convênio será feito. Isso varia de Estado para Estado, de região para região e a Defensoria deve ter essa possibilidade de selecionar. Ela é o órgão que tem a responsabilidade de fazê-lo.

APADEP: A autonomia da Defensoria Pública também é prerrogativa da Constituição Federal…

Oscar: Sim. A Defensoria é um órgão autônomo, resguardado claramente pela CF. Mas de que maneira ela é autônoma se não pode fazer a escolha sobre essa política de prestação de serviços subsidiários? Eu sempre gosto de frisar: a responsabilidade primária é da própria Defensoria, por prestar o serviço. No entanto, ela tem a liberdade, que é garantida pela sua autonomia, de selecionar os melhores meios de prestar o serviço subsidiário. Só que a lei em São Paulo inibe isso.

APADEP: E qual a importância, para os usuários do serviço, que a Defensoria tenha essa autonomia assegurada?

Oscar: Bem, qual é o prejuízo? É que você não pode aferir se o serviço está sendo bem prestado, se está realmente atendendo o interesse público, porque não tem alternativa. Já que o convênio é mandatório, você não tem como criar um controle sobre a qualidade da prestação do serviço. De que adianta eu diagnosticar que o serviço está precário neste e naquele aspecto, se eu não posso fazer nada porque a lei determina que esse é o único convênio que se pode ter? Então, nesse sentido, você cria um problema de eficácia na prestação do serviço. A lei é, portanto, permeada por uma série de inconstitucionalidades. Ela conflita em diversos pontos com a Constituição Federal.

APADEP: E como a Conectas avalia a atuação da OAB-SP nessa história toda?

Oscar: É uma posição extremante corporativa. Ela busca, sobretudo, atender aos interesses da própria OAB e não o interesse da sociedade, especialmente daqueles que utilizam, por carência, os serviços de advocacia pública. E me parece que politicamente também é negativo. Nós estamos em um país em que, infelizmente, a desigualdade e a pobreza são muito grandes e nós não podemos lutar pelo monopólio da pobreza. Você precisa de uma engenharia institucional que permita, em primeiro lugar, que haja experimentações, que haja uma flexibilidade para que novos modelos possam ser experimentados. E, mais do que isso, que você possa aferir se o modelo A é melhor do que o B, se o convênio desta ou daquela maneira, desta ou com aquela entidade é melhor. Nesse sentido, a atuação da OAB em São Paulo está prejudicando a criação de sistemas mais eficientes, mais qualificados, de convênios feitos pela Defensoria Pública. Que pode incluir a OAB, não há nenhum problema. A questão é você fechar a porta para outras alternativas.

APADEP: Como o Dr. explicaria melhor a posição “política” citada sobre a atuação da OAB-SP?

Oscar: É que a OAB está se limitando, nessa questão, a atuar em favor dos advogados. Ela não pode ser confundida como uma instituição apenas de defesa de interesses dos seus associados. Ela tem que transcender isso. A OAB tem uma história maravilhosa, uma instituição que sempre contribuiu com a democracia brasileira, lutou pelos direitos dos brasileiros. E nesse momento ela está recuando, pensando mais nos interesses específicos da corporação do que nos interesses da sociedade. Veja bem, isso me parece irracional porque, num modelo mais flexível, sempre serão advogados que estarão prestando este serviço. A única diferença é que eles não estarão recebendo os recursos por intermédio da OAB, mas sim por intermédio das associações as quais eles estiverem afiliados, aos grupos aos quais eles estiverem afiliados. No melhor sentido da palavra, que a Defensoria possa estabelecer uma competição e criar critérios objetivos para aferi-la. E é isso que está sendo vetado. É importante salientar, ainda, que os recursos, se distribuídos apenas para o OAB, fortalecem a organização do ponto de vista corporativo. Mas se distribuídos a partir de critérios objetivos de excelência, de eficiência na prestação do serviço, a Defensoria teria condições de prover um serviço mais qualificado do que outro que não tenha competição. Pode ser bom ou ruim, mas a avaliação atual não tem eficácia, porque você não pode alterá-la. Esse é o problema central. Nós temos que lutar contra tais formas corporativas que não atendem o interesse público mas sim os interesses das corporações.

CONVÊNIOS

Exclusivo para você Defensor Público
Associados da APADEP possuem descontos promocionais nos convênios firmados pela Associação. Veja as empresas conveniadas e códigos promocionais

ASSOCIE-SE

Se você é Defensor Público e deseja se associar à APADEP, favor preencher os dados abaixo e enviar e-mail para apadep@padep.org.br, confirmando seu pedido de filiação e autorizando o débito em conta corrente.
Seja bem-vindo!

Siga-nos nas redes