A adoção de cotas raciais nos concursos da Defensoria Pública

Por Silvio Luiz de Almeida

A adoção de cotas para negros e indígenas nos concursos para o preenchimento de cargos nas defensorias públicas encontra sólido amparo no ordenamento jurídico brasileiro. As cotas ou reserva de vagas pertencem ao rol das chamadas “ações afirmativas” que prevêem na sua formulação a atribuição de tratamento diferenciado a membros de grupos sociais historicamente discriminados com o objetivo de propiciar igualdade de condições e representatividade social, nos termos dos artigos 3º e 5º do Texto Constitucional.

Além da Constituição Federal, as cotas nos concursos públicos são sustentadas por diversas disposições infraconstitucionais, com destaque especial para o Estatuto da Igualdade Racial (Lei 12.288/2010). O objetivo do Estatuto é “garantir à população negra a efetivação da igualdade de oportunidades, a defesa dos direitos étnicos individuais, coletivos e difusos e o combate à discriminação e às demais formas de intolerância étnica” (art. 1º).

O art. 39 do Estatuto é específico ao determinar a implementação de ações afirmativas nas contratações do setor público, o que, por óbvio, abrange os concursos públicos. Quanto à autonomia federativa, frise-se que o Estatuto da Igualdade Racial é lei de abrangência nacional que amplia o acesso a direitos fundamentais e que institui diretrizes para o combate à discriminação racial, ação de competência comum dos entes federativos (artigo 23, incisos I e X, da Constituição Federal).

Assim, nada impede que instituições com autonomia administrativa e orçamentária – caso das defensorias estaduais – instituam cotas raciais, por meio de seus regulamentos próprios.  O inciso IV, do art. 7º, da Lei Complementar Estadual nº 988/2006, em que é afirmada a autonomia da defensoria para “prover os cargos iniciais da carreira e dos serviços auxiliares, bem como aqueles decorrentes de remoção, promoção e demais formas de provimento derivado”, descarta a necessidade de lei específica para a adoção de cotas ou quaisquer outras ações afirmativas.

Além disso, a Lei 988/2006, que disciplina o regime jurídico da Defensoria Pública de São Paulo, alinha os objetivos da instituição com os objetivos da República traçados pela Constituição Federal. Portanto, a Defensoria Pública de São Paulo possui autonomia não apenas para cuidar de interesses de seus integrantes, mas, sobretudo para que possa organizar-se da melhor forma possível a fim de atingir seus objetivos institucionais, conforme previstos na legislação.

A adoção de ações afirmativas teria um impacto extremamente positivo em uma instituição como a Defensoria Pública paulista, cujos fins institucionais estão diretamente vinculados à luta contra todas as formas de exclusão (artigo 5º da Lei 988/2006). A presença de defensores negros e indígenas traria para o interior da Defensoria – hoje uma instituição majoritariamente branca – a visão de mundo daqueles que são os principais usuários do serviço, em um contexto social em que a população negra de São Paulo tem seus direitos sistematicamente violados por ações violentas de agentes estatais.

Com a adoção de uma política de cotas raciais, a jovem Defensoria Pública de São Paulo dará um grande passo para que o serviço público deixe de lado a visão antidemocrática de que os problemas com os quais lida são problemas do outro, e passe a tratar as questões como problemas da sociedade em geral e pelo qual todos – inclusive os defensores – têm que se responsabilizar. A Defensoria se legitimaria frente à sociedade a que deve servir, pois dentro dela, parte dessa sociedade – a parte que mais sofre – estaria representada.

Silvio Luiz de Almeida é presidente do Instituto Luiz Gama,  Doutor em Direito pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (Largo São Francisco)e professor da Faculdade de Direito da Universidade Presbiteriana Mackenzie e da Faculdade de Direito da Universidade São Judas Tadeu.

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